Venezuela: A bancarrota do chavismo

| Por Miguel Angel Hernández*

O povo venezuelano sofre com inúmeras penúrias. Seguem o desabastecimento e as longas filas que este produz e o alto custo de vida. A situação se agrava cada dia mais. A vida cotidiana de venezuelanas e venezuelanos se complica mais ainda com a falta de água, apagões contínuos, péssimas vias de comunicação e sérios problemas de transporte. A todos esses infortúnios, se somam às demissões nas empresas públicas e privadas. No marco da crise, o povo e a classe trabalhadora venezuelana enfrentam uma violenta ofensiva por parte do governo e dos patrões, que tem retirado seus direitos políticos e sindicais, arrochado os salários, barateando a mão de obra a níveis não vistos nos últimos 50 anos. Têm-se flexibilizado as relações de trabalho com demissões massivas, tudo como parte do esforço do governo e empresários do setor privado de descarregar a crise nas costas do povo trabalhador.

O governo venezuelano, sob o manto de um falso discurso socialista, aplica um plano de ajuste que inclui demissões, aumento dos preços dos alimentos e demais produtos regulados, desvalorização, aumento das tarifas de transporte e serviços públicos, e está previsto um aumento da gasolina, que deve gerar uma espiral inflacionária nunca conhecida no país. O partido Socialismo e Liberdade vem afirmando que existe um acordo não assinado entre o empresariado agrupado na Fedecamaras e o governo, para jogar a crise sobre os trabalhadores, e para isto contam com a burocracia sindical.

O descontentamento social e a queda do respaldo ao governo

Toda esta situação está produzindo um desmoronamento da base social do chavismo e do governo. O descontentamento é crescente e generalizado. Pela primeira vez em 16 anos o governo se enfrenta com a possibilidade certa de ser derrotado em uma eleição. No dia 6 de dezembro, data das eleições parlamentares na Venezuela, o partido do governo pode perder a maioria na Assembleia Nacional. No último período, o governo de Nicolás Maduro, já sabendo da difícil situação econômica e social que seu governo e o PSUV devem enfrentar em um ano eleitoral, tem lançado ofensivas propagandísticas contra o imperialismo ou a velha direita, com os quais trata de eliminar o mal-estar crescente na população e reverter assim a tendência negativa a sua gestão. Primeiro utilizou a Ordem Executiva do governo norte-americano, que considerava a Venezuela como uma ameaça, buscando unificar a sua base social. Pouco durou o efeito positivo que a coleta de assinaturas contra o decreto de Obama possa ter tido em uma recuperação relativa de sua imagem. Logo depois, seguiu exacerbando os ânimos nacionalistas da população levantando a esquecida defesa de Esequibo, território em disputa com a Guiana desde 1899. Mais recentemente, Maduro responsabilizou os imigrantes colombianos “ilegais” e lançou uma campanha de deportações na fronteira com a Colômbia, acompanhada pelo estabelecimento de estados de exceção nos estados de Táchira, Zulia, Apure e Amazonas, fronteiriços com a Colômbia, com o argumento de enfrentar o paramilitarismo e o contrabando, como parte de uma suposta “guerra econômica” que estaria originando o desabastecimento. Segundo o Escritório da ONU para a Coordenação de Assuntos Humanitários, 1608 colombianos foram expulsos do território venezuelano e 19.686 regressaram por vontade própria desde 19 de agosto.

Todos estes recursos lançados pelo governo para levantar sua cada vez mais deteriorada imagem não tem produzido os resultados esperados pelos assessores governamentais. Pelo contrário, foram perdendo força e colocando em evidência que não eram mais do que cortina de fumaça, impulsionada com todos tipos de falsidades e amplificadas pelos meios de comunicação governamentais, qualificados para esta tarefa. Agora vemos como estas invenções midiáticas, criadas com objetivos claramente eleitorais, caem por terra. Das assinaturas recolhidas contra o decreto de Obama já ninguém se recorda. Não foram entregues em lugar algum e nunca mais o governo fez referência ao assunto. Maduro se reuniu com o presidente da Guiana e foi acordado o regresso dos embaixadores às respectivas capitais, diminuindo as tensões entre os dois países. Mas talvez o mais descarado é o ocorrido com os imigrantes colombianos deportados. Agora o governo de Maduro, depois de uma reunião com o presidente Santos, acordou com a Unasul facilitar o regresso dos deportados. Algo inacreditável que deixa claro que as motivações que originaram essa saída compulsiva do país não tinham nenhuma validade, que não eram paramilitares, e que em definitivo não são os responsáveis pelo contrabando e pela escassez de alimentos e outros produtos da qual padecem os venezuelanos.

Criminalização dos protestos e restrição das liberdades democráticas

Todas estas medidas do governo se produzem no marco de um recrudescimento da restrição às liberdades democráticas. Os estados de exceção na fronteira significaram a suspensão de garantias constitucionais, como a liberdade de manifestação e o direito à greve, entre outras. Paralelamente, o governo vem impulsionando há vários meses a chamada Operação de Libertação e Proteção ao Povo (OLP). Com o argumento do enfrentamento à delinquência, se colocou em prática um dispositivo repressivo, similar a outros aplicados no passado pelos anteriores governos patronais dos social-cristãos do Copei ou da Ação Democrática (AD), cujo saldo, até agora, é mais de 100 pessoas mortas em supostos enfrentamentos, nos quais não houve nenhum ferido das forças de segurança. De fato, se tornou público um vídeo onde policiais executavam um detido. Organismos de defesa dos direitos humanos têm denunciado abusos e despejos de pessoas de moradias humildes, assim como possíveis execuções extrajudiciais. No ano passado, depois dos protestos de fevereiro-abril, o governo adquiriu no exterior numerosos equipamentos antimotins. Gases lacrimogêneos, tanques e outros recursos foram comprados da Rússia. Coincidindo com este operativo, Leopoldo López, líder da oposição burguesa, foi condenado a quase 14 anos de prisão pelos protestos do ano passado, nos quais morreram 43 pessoas.A outra cara da repressão do governo, e que menos se difunde nos meios de comunicação, é a perseguição aos que lutam e se mobilizam, como é o caso de Bladimir Carvajal, trabalhador petroleiro, dirigente do PSL e C-Cura, que foi demitido por dirigir à luta pela discussão do contrato coletivo e por diversas reclamações dos trabalhadores petroleiros. Carvajal foi detido em fevereiro do ano passado, junto à José Bodas, Leonardo Ugarte, todos do PSL e C-Cura, junto a outros nove trabalhadores, por defender o contrato coletivo. Mas são muitas as demissões no país. É o caso de numerosas empresas públicas e privadas. Chrysler, Ford, Ajeven, Filtros, Wix, Protinal, Qué Pollo, Polar, usinas de açúcar, os ministérios. O governo também deteve oito trabalhadores de Civetchi, empresa mista com a China. Assim como a trabalhadores de Vtelca, outra empresa mista com esse país, produtora de telefones celulares, por se atreverem a conformar um sindicato. A OLP, os estados de exceção na fronteira, a perseguição aos que lutam, buscam amedrontar a população e dissuadir o aumento dos protestos em um grave contexto de crise econômica e social, e deterioração crescente do governo. Maduro tenta inibir qualquer possibilidade de explosões sociais.

Por uma alternativa socialista e revolucionária

O marco em que vão ocorrer as eleições é de crise econômica, inflação, desabastecimento, demissões e restrição às liberdades. Nosso partido segue colocando a necessidade de construir uma alternativa verdadeiramente revolucionária e socialista que acompanhe as lutas operárias e populares, e que se postule eleitoralmente, colocando suas candidaturas a serviço das lutas cotidianas do povo trabalhador.

*Professor da UCV e secretário-geral do Partido Socialismo e Liberdade (PSL), da Venezuela, seção da Unidade Internacional dos Trabalhadores – Quarta Internacional (UIT-QI)