O professor Valério Arcary e o planeta das derrotas – política e metodologia a serviço da Frente Popular!

Por: Marcello Bertolo e Silvia Santos 

O professor Valério Arcary, dirigente da Resistência (PSOL), em resposta a um texto de Mariucha Fontana (dirigente do PSTU), declarou apreciar polêmicas educativas e acreditar no valor da luta de ideias. “Sou a favor de debates das diferenças. Maior clareza ajuda a lutar”. Arcary escreveu ainda que não lhe agrada “a escola de discussão política que valoriza os excessos verbais”. E garantiu não gostar de “exacerbar as caracterizações dos adversários até o limite”.

No entanto, poucas horas antes, no XIII Congresso da FASUBRA, a postura de Valério Arcary foi absolutamente avessa a esta que afirma apreciar. Em uma mesa sobre conjuntura, Arcary não poupou verborragia e agitação de caracterizações ao polemizar de forma nada fraterna com Pedro Rosa, dirigente do Sindicato dos Trabalhadores da UFF e militante da CST-PSOL. O dirigente da Resistência acusou Pedro Rosa de desonestidade intelectual e a posição expressa pelo companheiro de ser “uma caricatura grosseira e deformada da política de Leon Trotsky”.

De forma arrogante e jocosa, afirmou viver em um mundo “muito diferente do planeta que o Pedro Rosa vive”, apontou que a posição do companheiro da CST-PSOL “não é política revolucionária”, a rotulou como “anarco-sindicalismo” e que a mesma “propõe ações aventureiras que preparam derrotas”. Com esta postura, Arcary atraiu aplausos eufóricos das claques lulistas da CUT e CTB, centrais às quais teceu críticas absolutamente esporádicas, para não dizer insignificantes. O Valério Arcary de outrora, que polemizava de forma apaixonada contra o reformismo, o centrismo, o lulismo e as demais direções traidoras, desapareceu. O de hoje direciona sua metralhadora argumentativa contra trotskistas da mesma tradição da qual ele próprio é oriundo.

Correlação de forças e defesa da Frente Popular

Por trás de uma agitação que falta com a verdade, há uma tentativa de esconder o debate político. Para Valério Arcary, “se iniciou nos últimos dois anos uma grande ofensiva da classe dominante”. Conforme sua análise, a partir de então “a situação ficou muito mais difícil” e “eles estão na ofensiva e nós estamos na defensiva”. É como se nada houvesse acontecido antes do impeachment de Dilma. A posição de Arcary neste caso segue rigorosamente a narrativa petista acerca dos fatos, vide sua caracterização sobre o que foram os treze anos de governo do PT. Ele avalia que tivemos um “governo de Frente Popular que propôs-se a fazer reformas no capitalismo”. E completa que “alguns de nós éramos também a favor de reformas, mas queríamos mais”. Trata-se de uma análise que destoa por completo do acúmulo da esquerda socialista ao longo destes treze anos, cujas expressões utilizadas para definir os governos petistas vão de “pacto conservador de alta intensidade” a “social-liberalismo”. Em nossa tradição sempre qualificamos os governos de conciliação de classes, de frente popular, como governos burgueses. Os programas sociais implantados por eles, como o Bolsa-Família, foram medidas sociais compensatórias limitadíssimas, tuteladas e orientadas pelo Banco Mundial, nada muito diferente do que já fora anteriormente aplicado por governos de origem genuinamente burguesa e longe de serem reformas no capitalismo. No mais, os governos petistas foram fieis aplicadores das políticas de austeridade, pagadores sistemáticos da dívida pública, praticantes obstinados das privatizações e da entrega do patrimônio público ao capital estrangeiro – cuja face mais visível foi a entrega do pré-sal – e contundentes impositores de medidas restritivas às liberdades democráticas como a lei antiterror. Os governos do PT conduziram um período de enriquecimento recorde do sistema financeiro e estão anos-luz distantes de serem meramente reformistas incapazes de atender de forma plena nossos anseios por reformas. Inclusive, o fato político que desencadeou o surgimento do PSOL e da CSP-Conlutas foi justamente o processo de enfrentamento às contrarreformas do governo Lula. Em nenhum momento foi uma luta por mais reformas, mas sim contra a retirada de direitos. Essa sim é uma verdadeira “caricatura” de caracterização do que foram os governos petistas. Trata-se de uma avaliação que consegue ser mais conivente com o PT que escritas até mesmo de setores explicitamente petistas. É assustador que Valério Arcary tenha migrado para uma leitura tão petista da realidade. Com sua nova visão, jamais os radicais teriam avançado e contribuído para a fundação do PSOL.  Jamais o sindicalismo combativo e classista teria fundando a CSP-CONLUTAS.

Há “hegemonia” do regime?

Em suas apreciações, Valério Arcary reconhece hoje que “governo Temer é dramaticamente fraco”. Declara que “há fraturas na classe dominante”. Delimita ainda que “há uma fração da classe dominante, que Temer representa, que está contra a lava-jato”. E afirma que estas são “razões pelas quais nós estamos a cinco meses das eleições, os prazos se apertam, e a classe dominante ainda não conseguiu dar o batismo à sua candidatura”. Aqui encontramos um profundo acordo em nossas análises. Contudo, diante de todos estes fatos que o próprio Arcary cita, ele contraditoriamente acredita que “a hegemonia do regime é fortíssima”.

Comecemos pela definição do regime: é uma combinação das instituições estatais que a classe dominante (ou um setor dela) utiliza para governar e manter a ordem vigente. Dentre os muitos regimes políticos que utiliza a burguesia, podemos destacar a grosso modo dois: a democracia burguesa, na qual as instituições fundamentais são os poderes executivo, legislativo e judiciário; e a ditadura, cuja instituição fundamental são as forças armadas. O que não significa que, no Estado capitalista, as forças armadas não sejam, sempre, as guardiãs de plantão do regime, conserve ele mais ou menos liberdades democráticas.

Pois bem. No mundo em que nós vivemos, que Valério Arcary afirma não ser o dele, a imensa maioria dos analistas e intelectuais, de todas os vértices políticos, dissertam sobre uma profunda crise da república constituída em 1988. Soma-se a isso a tendência crescente de abstenção e descrédito nas eleições, assim como amplo repúdio popular aos partidos e políticos tradicionais. Todos esses elementos e os pontos destacados pelo próprio Valério apontam de forma categórica que o regime está em crise. Como poderia um regime mergulhado em tensões tão agudas exercer uma hegemonia fortíssima? É uma contradição espantosa.

Concordamos com Valério Arcary quando diz que a classe dominante está unificada em torno ao tema da economia, da aplicação das políticas de austeridade e de ataques aos direitos e conquistas da classe trabalhadora. Contudo, a grande dificuldade da classe dominante em aplicar estas políticas reside na profunda crise de representatividade que vive o país e na divisão entre a burguesia sobre qual é a melhor tática para vencer a resistência dos trabalhadores. Esse inesgotável conflito, que se expressa na fratura e fragmentação da classe dominante em torno à saída política, deve, pode e precisa ser aproveitado pelo movimento de massas.

O medo e o derrotismo como armas políticas

Valério Arcary afirma corretamente que há dois perigos. Um seria o de subestimar a força do inimigo. O outro “é que a gente atribua uma força que o inimigo não tem”. Mas num quadro de crise política profunda que o país atravessa, somado ao descrédito nas instituições e às divisões profundas entre as frações da classe dominante, nos parece que Valério enxerga deliberadamente um inimigo mais forte do que ele de fato é. E isso tem uma explicação. Para justificar a permanente agitação da frente única incondicional com o petismo e defesa da narrativa lulista é preciso recortar a realidade e espalhar o medo.

A prática de exagerar alguns elementos de análise e esconder outros, valorizar e desvalorizar de forma desproporcional o peso dos acontecimentos, servem a construir narrativas, a contorcer a realidade até que ela caiba em uma política. Na mesa do CONFASUBRA, Pedro Rosa apontou precisamente a que serve essa prática, que propaga derrotas e espalha o medo. “O raciocínio dos companheiros, de que nada é possível fazer, que ninguém quer lutar e que é um retrocesso geral, é para dizer: ‘é preciso salvar uma luz’. E na lógica dos companheiros, defender o Lula é essa luz.”

Valério Arcary define que “uma parte da nossa classe está convencida que o problema do Brasil é corrupção, não é justiça, desigualdade, opressão. É um veneno ideológico do inimigo de classe que foi semeado na cabeça de milhões de trabalhadores”. Diz isso como se a corrupção fosse um fato desconexo dos demais, secundário, que não afeta a realidade objetiva da classe trabalhadora, que não tem consequências dramáticas nas condições de vida, como se fosse uma abstração com a qual os trabalhadores não deveriam se preocupar, como se a classe somente direcionasse sua atenção a isso por uma vontade ideológica da burguesia. A esquerda historicamente sempre combateu e denunciou a corrupção, que é inerente ao sistema capitalista. Mas para defender Lula e o PT, setores de esquerda abandonaram esta bandeira, atribuíram-lhe um caráter reacionário, minimizaram suas consequências objetivas e a entregaram para ser explorada de forma oportunista, seletiva, casuística e distorcida pela direita mais reacionária.

Nós seguimos defendendo a ideia de que é indispensável denunciar e repudiar a corrupção, sem seletividade. Devemos destacar que não confiamos no Supremo com suas políticas de acordo e conivência com os corruptos. Da mesma forma que não depositamos qualquer apoio ou credibilidade a Sergio Moro e ao Ministério Público do Paraná, que nitidamente utilizam a Lava-Jato conforme suas colorações e preferências partidárias. Queremos os burgueses envolvidos na corrupção e seus agentes políticos igualmente corruptos na cadeia, todos eles, sem seletividade, com seus bens confiscados. Não há nenhuma falta de “honestidade intelectual” da nossa parte, como acusa Arcary. Nossa posição sobre esse tema é absolutamente explícita e foi amplamente expressa durante o Congresso da FASUBRA pelos nossos companheiros ao longo dos debates.

Afinal, quem vive em outro planeta?

No planeta de Valério Arcary a apatia reina sobre a classe trabalhadora. Ele enxerga uma classe trabalhadora conformada, perplexa, anestesiada. “Há perplexidade na classe”, afirma. Para confirmar essa avaliação, Arcary articula afirmações sem apresentar quaisquer dados que as comprovem. Ele diz que “no ano passado o que mais teve nesse país foram greves derrotadas. Heroicas e derrotadas”. Mas no mundo real, os dados são outros. No ano de 2017, 79,5% das campanhas salariais fecharam acordos superando os índices de inflação, segundo dados da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (FIPE). Não somos nós de outro planeta que falamos, são os números da FIPE.

Não há luta de classes no planeta de Valério Arcary. Mas no planeta Terra real ela existe. Recentemente, sem São Paulo, no epicentro do país, uma massiva greve dos servidores municipais de São Paulo derrotou o prefeito Doria e sua reforma da previdência. Foram multidões nas ruas, encarando uma repressão violentíssima. Uma das marchas se uniu de forma emocionante com a manifestação por Marielle. No planeta de Valério Arcary esse triunfo inexistiu. Assim como inexistiu o triunfo contra a reforma da previdência de Temer, cuja a mão não tremeria, segundo Valério, porque havia “Maia e Eunício de Oliveira para conduzir o Congresso Nacional”. A mão de Temer tremeu e o erro de cálculo é parte de uma política covarde de se recusar a disputar a direção do movimento com políticas ofensivas que respondam às reais necessidades da classe.

No planeta de Valério Arcary não houve, em abril do ano passado, a maior greve geral que se tem registro na história brasileira. Assim como não ocorreram atos massivos nas ruas em março que tomaram as ruas das principais cidades do país contra a Reforma da Previdência. Da mesma forma, em maio, não ocorreu a maior marcha sindical à Brasília da história recente, quiçá de todos os tempos. Todos esses importantes acontecimentos seriam, conforme a avaliação de Arcary, fantasias do nosso planeta paralelo.

Os metroviários de São Paulo reverteram este ano 42 demissões. Os metalúrgicos do ABC fizeram acampamentos e greves, revertendo demissões, e impuseram uma campanha salarial unificada que barrou a aplicação da reforma trabalhista nas fábricas. Da mesma forma, os professores das escolas particulares de Belo Horizonte deflagraram greve e conseguiram arrancar um acordo sem que fosse aplicada nenhuma cláusula da reforma trabalhista. No planeta de Valério Arcary essas greves foram derrotadas.

No ano de 2016, o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE) registrou que houve o maior número de greves da história do país. Ainda não revelaram os dados de 2017, mas não nos parece que tenha sido diferente. Isso ocorreu nesse planeta. No planeta de Valério Arcary “há perplexidade”.

Da mesma forma, o cenário devastador pintado por Valério Arcary não explica porque explodiram manifestações em repúdio ao assassinato de Marielle e Anderson, pelo país inteiro e pelo mundo. No Rio de Janeiro, mais de 150 mil pessoas tomaram as ruas já no dia seguinte ao crime, numa resposta imediata. Da mesma forma, expressivas mobilizações de mulheres em 2016 desgastaram Cunha – que foi deposto, cassado e preso –, assim como desmoralizaram Pedro Paulo, que ficou de fora do segundo turno para a prefeitura do Rio de Janeiro, abrindo espaço para Marcelo Freixo. Estas mobilizações moveram especialmente a classe média, a qual Arcary atribui um “giro à direita”.

O que fica explicito é que não há disposição da classe trabalhadora em sair às ruas para defender um ex-presidente preso acusado por corrupção, que governou por oito anos em pacto com o que há de mais reacionário, conservador, corrupto e fisiológico na política brasileira. Sobre este tema, realmente, há perplexidade na classe.

O problema da direção

Após a manifestação em Brasília e as gravações da JBS com Temer dando o aval para a compra do silêncio de Cunha, o governo estava nas cordas e prestes a cair, ficando muito próximo da renúncia. O que fizeram as burocracias sindicais? Desmarcaram a greve geral de junho. Esse desmonte foi decisivo para a aprovação da reforma trabalhista. Abriram mão de mobilizar em um momento que a maioria dos parlamentares estava sob pressão por medo de prejuízo eleitoral e, por consequência, de uma futura perda do foro privilegiado. Bolsonaro, tão alarmado por Arcary, foi questionado massivamente em suas redes sociais, pelos seus próprios seguidores, por ter votado a favor da reforma trabalhista. Havia espaço, havia efervescência. Em dezembro, a história se repetiu, com novo desmonte da greve geral. Apesar disso, o governo Temer ainda assim não teve forças para aprovar a Reforma da Previdência. Naturalmente, se as burocracias não desmontassem as greves gerais e não sabotassem as mobilizações, a possibilidade de derrubada do fraquíssimo governo Temer poderia ressurgir como em maio e junho do ano passado.

Mas para Valério Arcary não há problema de direção, isso é absolutamente irrisório. A “má postura” (belo eufemismo) da CUT tem pouca importância. Há “dificuldades reais”, mas a traição das direções não seria uma delas. Para ele, o problema central é o desânimo colossal dos trabalhadores e força irresistível do regime. Os fatos aqui citados, de cima a baixo, desmentem isso, mas nós é que vivemos em outro planeta.

Segundo Arcary, “a ampla maioria dos trabalhadores concorda com as nossas causas. Quando não se mobilizam é porque não acreditam na vitória”. Para ele, trata-se de um problema de crença, de entendimento, de compreensão da realidade. Para nós, o que move os trabalhadores são suas necessidades objetivas, suas condições de vida. Esse, aliás, foi um tema amplamente desenvolvido por Nahuel Moreno, em inúmeros debates no interior da IV internacional. Arcary, que acusa Pedro Rosa de defender uma “caricatura grosseira e deformada da política de Leon Trotsky”, aqui expressa uma antítese do que Trotsky defende no Programa de Transição. Em toda explanação de Arcary, o problema da direção é absolutamente secundário quando não inexistente. Isso é uma negação da política de Leon Trotsky. Trotsky registra que “a orientação das massas está determinada, de um lado, pelas condições objetivas do capitalismo que se deteriora; de outro, pela política traidora das velhas organizações operárias”. E é categórico ao dizer que “a crise histórica da humanidade reduz-se à crise da direção revolucionária”. Mas, para Valério Arcary, a disputa pela direção do movimento de massas é tema “en passant”, que aparece apenas de forma passageira em suas atuais análises. Esse é um debate muito antigo e conhecido, pois sempre esteve presente nas elaborações de todas as correntes revisionistas que existiram no movimento trotskista.

O temor do “fascismo” para justificar o lulismo

No planeta Arcary há uma onda conservadora e um avanço fascista no país. Um dos elementos fundamentais que comprovam isso seria que um pequeno grupo de alpinistas reacionários escalou o Corcovado para erguer uma enorme faixa anticomunista, fato destacado com grande ênfase no CONFASUBRA pelo professor Valério. Isso sim é um fator relevantíssimo da conjuntura, que explica a necessidade de priorizar com todas as forças a defesa da liberdade de Lula e a luta contra o fascismo. Já organizar greves e lutas de massa contra o governo, o ajuste e as reformas é perigosíssimo, aventureiro e nos levará a derrotas. Para o professor Valério, o caminho das vitórias é “Lula livre” e frente única incondicional para derrotar o perigo fascista.

Evidentemente que não devemos subestimar o alcance e a audiência da extrema-direita, cujos expoentes maiores são Bolsonaro e o MBL. Estes setores se arvoram defensores da moralidade, mas tem teto de vidro. Bolsonaro recebia auxílio-moradia, mesmo tendo imóvel próprio em Brasília, para “comer gente”, ele disse. O mesmo Bolsonaro teceu elogios ao corrupto Cunha e exaltou Brilhante Ustra, um criminoso torturador do regime militar. O MBL, que diz combater a corrupção, jamais defendeu a saída de Temer, mesmo com todos os flagrantes e todas as evidências contra ele, expondo sua seletividade e hipocrisia. Estas contradições resultaram em fiascos notórios das recentes manifestações convocadas por esta extrema-direita, a despeito da audiência e do peso eleitoral destes setores.

É imprescindível combater e derrotar as posições e políticas dessa extrema-direita que, tirando proveito da crise de representatividade, se alimenta da difusão do medo, da propagação de mentiras e da disseminação do ódio. Espalham medo do comunismo, temor da violência e apontam como saída: Bolsonaro e intervenção militar. Há exemplos significativos e sólidos de peleja contra estes setores, tais como a luta dos professores contra o projeto “escola sem partido”, a batalha nas mídias sociais e no campo jurídico contra as “fakenews”, a luta das mulheres contra a cultura do estupro e pelo direito de decidir, a embate da população negra contra o genocídio promovido pelas forças do Estado, a mobilização de LGBTs contra o preconceito, as agressões e os crimes de morte desta população, a comoção por Marielle e Anderson, a campanha por liberdade para Rafael. Lutas sérias, firmes, representativas, reais, valorosas.

Contudo, o que defendem os agentes lulistas e Valério Arcary está longe de ser uma batalha coerente contra a extrema-direita. A grande proposta que eles apresentam para combater o “fascismo” é a realização de atos festivos pela democracia, de caráter eleitoral, tais como os realizados no Circo Voador, no Rio de Janeiro, e na Boca Maldita, em Curitiba. Atos estes que emocionam e entusiasmam o professor Valério, assim como empolgam as claques lulistas e também parte da esquerda socialista, mas não tem real apelo de massas. O fato é que se houvesse verdadeiramente um avanço fascista, resultado de uma onda conservadora, não seríamos capazes de enfrentá-las com esses meetings. Para “combater” a extrema-direita, os agentes lulistas lançam mão do mesmo método deles: espalhar terror e histeria. Assim exageram feitos como a iniciativa de cravar uma bandeira anticomunista no Corcovado como se fosse algo de extrema relevância. Porque para eles interessa uma polarização baseada em superdimensionar fatos que facilitem a estruturação de suas narrativas.

Arcary e a greve da FASUBRA

Valério Arcary cita a greve da FASUBRA de 2017 como “heroica”, destacando as “enormes dificuldades” que ela enfrentou. De fato, a construção de uma greve como esta não é um processo fácil, mas naturalmente havia agitação nas bases, já que a mesma não surgiu de uma proposta da direção desta federação. A fala de Valério ignora esse aspecto. A greve não partiu da vontade dos dirigentes, cuja a imensa maioria tinha uma avaliação semelhante a dele, de que era muito difícil ou até mesmo impossível avançar. No entanto, a greve foi deflagrada, o que não impediu que, a todo momento, os setores que hoje formam a Resistência, corrente de Valério Arcary, tivessem um papel central em construir um pacto de consenso com CUT e CTB para encerrar a greve o quanto antes. Esse pacto se materializou de forma mais expressa no dia 5 de dezembro, ironicamente a mesma data da greve geral desmarcada pelas maiores centrais, quando votaram na direção da federação o fim da greve. A resposta das bases foi contundente: manteve-se a greve, conforme decisão de mais de 30 universidades. A UFRJ foi um símbolo importante. Deflagrou greve contra a vontade da direção do sindicato local por esmagadora maioria e manteve a greve a despeito da ampla maioria dos dirigentes da federação. Isso Valério não cita. Como ele explica isso? Porque Valério não explica como mais de 30 universidades votaram pela continuidade da greve, convergindo com uma pequena minoria que vive em um outro planeta que não o dele? Minoria esta que, resultado desse processo, agregou novos aliados no congresso da Federação, enquanto o coletivo liderado pela Resistência diminuiu. Diminuição esta que possibilitou aos lulistas da CUT e CTB retomarem a maioria da federação. Foi essa política desastrosa e capituladora, defendida pela Resistência, que refortificou o lulismo na FASUBRA, assim como trouxe a burocracia de volta à direção do SINASEFE. Também fez aumentar de forma significativa o peso do PT e do PCdoB na base do ANDES, chegando a ameaçar a presença da esquerda na direção desse importantíssimo sindicato.

O tema da “honestidade intelectual”

Queremos ainda retomar o tema da “honestidade intelectual”. Mas desta vez a de Valério Arcary. Para tanto, transcrevemos um trecho completo de sua fala no XXIII CONFASUBRA. “O Pedro quando se referiu ao debate na CSP-Conlutas disse que eu teria afirmado que não havia condições para a greve geral um mês antes da greve geral. De fato houve um debate na Plenária Nacional da CSP-Conlutas para a qual eu fui convidado, para fazer uma intervenção sobre a análise de conjuntura. Não foi um mês antes do 28 de abril, a data da greve geral, foram três meses antes. Foi em 28 de janeiro e eu não defendi que não haviam condições para a greve geral. Para facilidade de todos os colegas que eventualmente acreditaram no que o Pedro disse, a minha intervenção está gravada e disponível na internet”, afirmou Arcary.

Tal qual Valério nos aconselhou, assistimos o vídeo disponibilizado pela CSP-Conlutas. Segundo a descrição, o debate foi “realizado na sexta-feira (3/2)” e não em 28 de janeiro. Mas não nos atemos às minúcias das datas que pouco ou nada alteram o teor da polêmica. Escutamos atentamente as seguintes palavras de Arcary: “Exige compreender o momento no qual está hoje a classe. Hoje a classe não está preparada para a greve geral, vamos dizer as coisas com toda a verdade”. Pedro errou na data. Mas apenas nisso! Já Valério errou nas datas nos prognósticos e em negar o que havia dito.

Luta em vez de Lula

A proposta que fazemos a Valério Arcary e à Resistencia, assim como a todas as correntes do movimento, aos trabalhadores, aos seus sindicatos e às suas direções não tem nada de absurdo ou fantasioso, como tentam a fórceps nos estigmatizar por defender outra posição. Propomos lutar e exigir que as direções burocráticas impulsionem as mobilizações. Em vez de repetir a cantilena tediosa do ‘Lula livre’, que não empolga os trabalhadores e a população em geral, cuja maioria apoia ou não se importa com a sua prisão, propomos retomar com todas as forças a bandeira do Fora Temer, lutar contra a intervenção federal no Rio de Janeiro, pela revogação das medidas de ajuste fiscal, por aumento de salário e melhores condições de trabalho. Queremos ocupar as ruas em defesa das escolas e universidades públicas, pela suspensão do pagamento da dívida pública aos banqueiros, por investimentos nas áreas sociais e pela revogação da reforma trabalhista e da EC 95. Queremos construir unidade de ação com todos os setores do movimento de massas por justiça para Marielle e Anderson, contra as chacinas nas periferias pelo fim do encarceramento massivo da juventude negra e pobre, por Rafael Braga livre, pela desmilitarização da PM, pelo fim das mortes no campo. Mais ainda, queremos somar esforços pelo fim da impunidade para Temer, Aécio e Alckmin, entre outros corruptos reacionários, pela prisão e confisco dos bens de todos os políticos e empresários corruptos e por expropriação de seus bens e empresas.

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