Previdência Social: Quando as centrais recuam, os governos avançam

A primeira proposta de Reforma da Previdência foi impulsionada no primeiro mandato de FHC. Entre os principais objetivos estava a substituição do tempo de serviço por tempo de contribuição. Além disso, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) permitia a expansão da previdência complementar.

A tramitação da PEC desencadeou uma onda de mobilizações, influenciada pela greve geral na França contra a Reforma da Previdência daquele país. O texto-base da PEC foi rejeitado na primeira votação, em março de 1996. O governo então reviu sua estratégia. FHC propôs um acordo com as centrais sindicais, que passaram a negociar pontos da reforma. As negociações resultaram num “protocolo conjunto” firmado entre o governo, o relator e as centrais. Assim foi mantido o essencial da PEC e as centrais sindicais forneceram legitimidade para que a proposta fosse aprovada em 1998, dois anos após o início de sua tramitação.

A adesão da CUT ao acordo proposto pelo governo FHC foi conduzida pela direção majoritária da central, à revelia das bases, sem que fosse realizada uma assembleia sequer de qualquer categoria. A central era presidida na época pelo atual deputado federal Vicentinho (PT-SP).

As mudanças instituídas pela EC 20/1998 resultaram em uma redução de 30% no valor médio das aposentadorias do Regime Geral de Previdência Social (RGPS). Em média, o tempo para a aposentadoria foi estendido em mais sete anos de trabalho.

Reforma da Previdência do governo Lula

Na Constituição de 1988 não existia a figura da previdência privada. Com a aprovação da Emenda Constitucional (EC) 20/1998, esse formato de previdência passou a constar na Carta Magna do país. Na época, uma Ação Direta de Inconstitucionalidade, impetrada por partidos e organizações sindicais, impediu que a previdência privada fosse implantada durante o governo FHC, por esta ser sido criada através de lei complementar.

Os ataques aos Regimes Próprios de Previdência Social (RPSS) ficaram a cargo do recém-eleito governo Lula, em 2003. O novo presidente estava legitimado por uma vitória histórica nas urnas, com forte apoio popular e comoção pela chegada de um ex-operário e ex-sindicalista ao governo do país. Lula montou um acordo com os 27 governadores, incluindo os da oposição, e subiu a rampa do Congresso para entregar em mãos o projeto que originaria a EC 41/2003.

Para atacar a previdência dos servidores públicos, Lula foi mais eficiente que seu antecessor. Em vez de “lei complementar”, o projeto de reforma instituía que a previdência privada seria por decreto-lei de iniciativa do poder executivo. Através de portaria ou decreto, prefeitos, governadores e o presidente da República poderiam impor um fundo de pensão. A partir da criação desse fundo, os servidores estariam submetidos a um teto de aposentadoria que hoje é de R$ 5.839,45. A mesma limitação não foi imposta a aposentadorias especiais de parlamentares, governantes, juízes e militares de alta patente, por exemplo. A EC 41/2003 também instituiu a taxação dos servidores públicos aposentados.

A Reforma da Previdência do governo Lula deu origem a uma rebelião das categorias do serviço público e de ruptura nas bases do PT. Surgiram assim os chamados “radicais do PT”. Os deputados Babá, Luciana Genro, João Fontes e a senadora Heloísa Helena se colocaram na oposição ao projeto de Reforma, entre outras medidas neoliberais em curso, estando presentes nos protestos e sofrendo juntos aos manifestantes os efeitos da repressão policial.

A direção majoritária da CUT, atrelada ao novo governo, operou para desmontar as mobilizações e negociar emendas à proposta de Reforma, a exemplo do que ocorreu durante a tramitação da PEC de FHC. Houve grande descontentamento nas categorias do serviço público, gerando um processo de rupturas de diversos sindicatos com a CUT.

A Reforma foi aprovada em agosto de 2003. O voto dos “radicais” contra a Reforma de Lula culminou na expulsão de Babá, Luciana Genro, Heloísa Helena e João Fontes em dezembro. O processo de ruptura resultou um ano depois na fundação do PSOL, que foi legalizado em 2005. A senadora ganhou grande projeção nacional e obteve mais de 6,5 milhões de votos como candidata a presidenta nas eleições de 2006.

Desmonte das Greves Gerais no governo Temer

O governo Temer apresentou, no ano de 2017, proposta de Reforma da Previdência com foco no aumento da idade mínima e do tempo de contribuição. A magnitude das mobilizações contra o projeto, combinadas à rejeição de Temer e à aproximação das eleições tornou inviável a aprovação das mudanças nas regras da aposentadoria.

Contudo, durante esse processo, os recuos protagonizados pelas maiores centrais, tais como CUT, Força Sindical e CTB, permitiram que o governo avançasse em outros ataques.  As cúpulas das centrais costuraram um acordo sobre a votação da Lei das Terceirizações, que foi quebrado pelo presidente da Câmara. Rodrigo Maia subitamente colocou a matéria em votação, tendo esta sido aprovada.

As maiores centrais desmontaram a Greve Geral marcada para 30 de junho, dando fôlego para o governo aprovar a Reforma Trabalhista. Também foi desmarcada a Greve Geral que seria realizada em 5 de dezembro, mas o governo Temer já agonizava em sua rejeição e não conseguiu maioria suficiente para aprovar a Reforma.

Centrais facilitam a vida de Bolsonaro e Maia

Recentemente, na tramitação da Reforma da Previdência de Bolsonaro, assistimos as maiores centrais sindicais repetirem o mesmo modus operandi ao priorizar conversas de bastidores com Rodrigo Maia e articulações com o chamado “Centrão” antes da aprovação da PEC em primeiro turno na Câmara. Durante praticamente um mês, Maia anunciou o dia 6/8 como data de votação do segundo turno da Reforma da Previdência. À exceção da CSP-Conlutas, as centrais sindicais passaram todo esse tempo sem convocar ou exigir qualquer mobilização para essa data, facilitando a vida de um governo em franca queda de popularidade.

Por Marcelo Bertolo – CST/PSOL

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