A quarentena deve ser feita?

Escreve: Luis Covas, militante do Izquierda Socialista, seção argentina da Unidade Internacional de Trabalhadoras e Trabalhadores – Quarta Internacional (UIT-QI). Traduzido por: Caio Sepúlveda


O tema “Quarentena sim ou quarentena não” está em discussão desde o primeiro dia que se aplicou a medida na Argentina e no mundo. Existem muitas trabalhadoras, trabalhadores, donas de casa ou jovens que a questionam ou tem dúvidas sobre mantê-la, por diversas razões: Cansaço, tédio ou pela necessidade de sair para fazer um bico e conseguir uns pesos para sobreviver. Ainda mais vendo que, no caso da Argentina, ainda não há um contágio massivo ou mortes como na Itália, Espanha ou nos Estados Unidos.

A confusão piora por alguns setores da esquerda questionarem a quarentena argumentando que é um medida “medieval” e que ataca liberdades individuais  da classe operária. Ou que as quarentenas são manobras dos governos para parar os protestos e as manifestações.

Rechaçar a quarentena por esses argumentos é equivocado. A realidade demonstrou que ela é uma necessidade para combater o contágio massivo. Recomendada pela maior parte dos especialistas médicos do mundo.

Desde já rechaçamos que os governos capitalistas usem a pandemia do coronavírus para frear as mobilizações e incentivar a presença policial repressiva e de forças militares, algo que rechaçaremos também depois da pandemia.

Mas nós da esquerda não podemos minimizar, enfrentamos uma pandemia mundial que não terminou, cujo alcance se desconhece e para a qual não existe ainda uma vacina.A quarentena é uma ação para frear o contágio. Onde não se aplicou de forma imediata, por responsabilidade dos governos, como na Itália, Espanha, Reino Unido e nos Estados Unidos, o contágio cresceu exponencialmente. O negacionismo de Trump e a política anti-quarentena para que a economia “não afunde”, defendendo as multinacionais, fez com que nos Estados Unidos, no momento em que escrevíamos essa nota, já passasse de um milhão de casos positivos de COVID-19 e mais de 57.000 mortes, encabeçando a lista mundial de contágios e mortes.

A experiência da Suécia e Noruega, por exemplo, também demonstram isso. “Até o dia 12 de março ambos países tinham um número parecidos de casos confirmados (672 e 794 respectivamente) e somente uma morta na Noruega. No dia seguinte, Noruega tomou a decisão de isolar sua população enquanto a Suécia não o fez. A partir desse momento a quantidade de casos na Suécia duplica em relação a Noruega, e o número de mortes é sete vezes maior, 1.099 contra 150” (Clarín, 19/04/20)

O fato de que na Argentina existam poucos casos (207 mortes) tem a ver com se ter feito quarentena antecipada. O oposto acontece no Brasil, que carrega mais de 5.000 mortes registradas.

Porém a quarentena é a primeira medida, não a única, para evitar a propagação do contágio e proteger a vida de milhões. Além dela, se necessita que o governo destine dinheiro para que implementem os testes massivos, fortalecer o serviço de saúde, salário e alimentação.

Por isso as coisas não são como o governo Alberto Fernandez tenta fazer parecer. A Argentina e o mundo encaram essa pandemia em meio à destruição dos sistemas de saúde pública estatais, com altos graus de desigualdade, superlotação e com governos patronais que favorecem os empresários, os banqueiros e o pagamento de uma fraudulenta dívida pública.

Por isso não existe uma verdadeira quarentena, apesar do enorme sacrifício que milhões fazem com seu confinamento. Existem duas quarentenas. Uma é a dos grandes patrões, dos poderosos que dispõem de riqueza e comodidade, e a outra, a quarentena do povo trabalhador, a dos de baixo, a dos que o salário não é o suficiente, pois receberam cortes ou foram diretamente demitidos ou vivem de bicos. A dos que nos bairros populares vivem confinados, não tem saneamento básico nem água limpa para lavar as mãos.

O presidente chama a “responsabilidade individual” ou a uma “flexibilização” da quarentena para que haja “dispersão familiar”. Quando na realidade a quarentena já está flexibilizada faz tempo por responsabilidade do governo e do empresários, pois centenas de milhares estão obrigados a sair para trabalhar em serviços não essenciais, pressionados pelas patronais e porque precisam de dinheiro para sustentar sua família. Também estão sendo obrigados a romper a quarentena os trabalhadores que tem que sair para reivindicar contra as demissões, a diminuição dos salários ou porque não são fornecidos materiais de segurança para evitar o contágio de COVID-19. Como no caso dos operários do frigorífico Penta, que foram demitidos enquanto o governo peronista de Kicillof endossava a patronal e reprimia os trabalhadores. A eles se somam os justos protestos de trabalhadoras e trabalhadores da saúde e de outros setores de todo o país. Nós da Izquierda Socialista apoiamos essas lutas. Diante destes atropelos, a classe trabalhadora não pode se disciplinar na quarentena, tem o direito de sair à rua para reivindicar. Repudiamos toda repressão ou questionamento legal que o governo e a justiça patronal querem fazer utilizando o argumento da quarentena. Quando são o governo nacional e os governadores peronistas e da oposição que não garantem a saúde, o salário, o trabalho e a alimentação. Dessa forma se luta também por uma verdadeira quarentena para evitar o avanço do coronavírus. Mais ainda quando os especialistas dizem que não chegou o pico da pandemia, que pode ocorrer entre maio e junho, favorecido pela chegada das temperaturas mais baixas. Por isso, nos opomos a “flexibilizar” ou acabar com a quarentena por causa da pressão das grandes patronais, que o governo nacional cede porque governam para elas, com a cumplicidade da burocracia sindical. Nós da Izquierda Socialista e da FIT-Unidade seguimos chamando a lutar por um fundo de emergência, com base em altos impostos aos grandes empresários e à banca. E deixar de pagar a dívida para que haja uma quarentena com dinheiro para saúde, para alimentação e sem demissões nem cortes de salário.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *