Venezuela: Impulsionemos uma alternativa político-eleitoral dos trabalhadores e o povo
Venezuela passa por uma crise generalizada que se expressa no terreno econômico, social, político, cultural, e no funcionamento geral da sociedade. Nossa principal indústria, a petroleira, se encontra no chão. As empresas básicas estão a morrer em declínio, corrupção e violação aos direitos dos trabalhadores. O povo trabalhador perde horas nas vergonhosas filas tratando de adquirir os alimentos que estão em escassez. Muitas das empresas e fazendas compradas pelo governo se encontram paralisadas ou produzindo bem abaixo da sua capacidade, enquanto aos seus trabalhadores se desconhecem seus contratos coletivos e lhes cerceiam o direito à organização sindical autônoma.
Os salários foram destruídos pela inflação mais elevada do continente. Só o ano passado foi de 68,5%, e nos meses que já passaram em 2015, o governo oculta os dados, pois sabe que serão escandalosamente altas. Há milhares de demitidos e suspensões em muitas empresas públicas e privadas em todo o país, avalizadas pelas inspetoria do trabalho (órgão governamental), e com o olhar e a ação complacente da burocracia sindical. Os exemplos mais impactantes são nos estados de Bolívar e Carabobo.
Pdvsa (estatal venezuelana de petróleo) foi entregue às transnacionais através dos contratos de empresas mistas que deixam vulneráveis nossa soberania. Os serviços públicos estão muito mal. Em muitas partes falta água, falta luz a qualquer hora, as vias públicas estão deterioradas. A corrupção é campeã em todos os níveis, especialmente no seio das instituições do Estado. Bilhões de dólares tem parado nos cofres dos grandes empresários e burocratas e outros tantos bilhões tem sido roubados ao povo através de importações fraudulentas realizadas por empresas fantasmas. A violência, o narcotráfico e outras formas de decomposição social oprimem aos habitantes de comunidades populares na maior parte do país, aumentadas pela impunidade reinante e o crescimento da desigualdade social.
Para aplicar seu plano de ajuste, o governo criminaliza os protestos operários e populares. Restringem-se as liberdades democráticas, chegando à detenção de trabalhadores e dirigentes sindicais por realizar assembleias ou participar em atos, e inclusive a desaparição física de quem denuncia a corrupção, como ocorreu com o ativista Alcedo Mora.
Enquanto isso, este fim de semana se realizaram as eleições primárias da MUD (Mesa de União Democrática, coligação da oposição de direita venezuelana) em meio de uma grande ausência e de descontentamento de milhões de pessoas que vêm como o partido Ação Democrática e Primeiro Justiça manipulam esse processo. No próximo mês estão previstas as primárias do partido do governo, o PSUV, no qual seguramente haverá novamente uma débil participação, a sabendo de que já todo está controlado desde a cúpula do PSUV. O CNE como organismo que rege o processo eleitoral faz um silêncio de cumplicidade sobre a data definitiva para o início da corrida eleitoral, enquanto projetam os circuitos, o que acaba favorecendo o partido do governo.
Dada a gravidade e complexidade da crise que atravessa o país, consideramos que uma alternativa político-eleitoral deve estar à altura desta situação. Esta deveria enfrentar ao bipartidarismo PSUV-MUD e apresentar ao país uma proposta de transformação radical que gire ao redor de temas que hoje são muito sensíveis para o povo como o salário, a inflação, as demissões, a crise da saúde, dos serviços, o tema do petróleo, a criminalização dos protestos e as restrições às liberdades democráticas.
O PSUV e partidos do Polo Patriótico, há 16 anos frustaram as grandes expectativas que se criaram no povo ao levar Chávez ao poder em 1999. Por sua parte, os partidos pró-imperialistas e aliados das transnacionais agrupados à MUD, os quais governaram durante o puntofujismo**, demonstraram no passado seu talento antidemocrático, repressivo e defensor dos interesses imperialistas, e hoje evidenciam nas prefeituras e nos governos sua incapacidade e sua disposição a defender os interesses patronais, divorciados das penúrias que diariamente atravessam os trabalhadores e habitantes das comunidades populares do país. O silêncio, a prostração e a irresponsabilidade demonstrada no parlamento os desqualifica para continuar apresentando-se como alternativa ao desastre do governo. Só tratam de pescar no rio revoltoso da crise, mas na realidade não têm nada a oferecer ao povo para enfrentar a grave situação que estamos sofrendo.
Portanto, é necessário romper este falso dilema do governo e a MUD, levantando uma alternativa verdadeiramente revolucionária, que ponha como centro na defesa dos direitos dos trabalhadores e o povo, que enfrente nas ruas mediantes a mobilização o plano de ajuste que aplica Maduro com apoio dos empresários, banqueiros, transnacionais e a MUD. E no plano eleitoral, apresentar ao povo trabalhador uma opção que desde à Assembleia Nacional apoie e acompanhe as lutas operárias e populares contra o ajuste acordado por Maduro e os empresários. Trata-se de apresentar uma alternativa dos trabalhadores e o povo oprimido.
Consideramos que essa alternativa não deve ter compromissos com o partido do governo e nem com a MUD. Seus candidatos devem seus lutadores sociais, que ponham suas campanhas ao serviço das lutas operárias e populares em todo o país. Essa alternativa político-eleitoral deve apresentar um programa para apresentar na Assembleia Nacional projetos de leis e investigações parlamentares, que contemplem os seguintes elementos:
1.- Aumento geral de salários e salário mínimo igual à cesta básica oficial com ajustes periódicos de acordo com o índice de inflação, em concordância com o artigo 91 da Constituição.
2.- Prisão e confiscação de bens para burocratas corruptos e aos que superfaturam as importações. Não ao aumento da gasolina.
3.- Não à criminalização dos protestos e a restrição das liberdades democráticas. Anistia para trabalhadores, indígenas, camponeses e estudantes presos por protestar ou fazer greve. Revogação da resolução 008610. Revogação das normas que causam vulnerabilidade da liberdade sindical, o direito de greve e aos protestos operários e populares.
4.- Por um plano econômico e social alternativo. Por uma indústria petroleira 100% estatal, sem empresas mistas nem transnacionais, baixo o controle e a gestão democrática de seus trabalhadores, profissionais e técnicos.
5.- Reforma agrária e fim do latifúndio.
6.- Resgate das industrias básicas. Plano de inversão baixo o controle dos trabalhadores e suas organizações sindicais.
7.- Pela revogação da Lei Orgânica de Processos Eleitorais (LOPE). Representação proporcional das minorias. Igual acesso aos meios de comunicação para todos os candidatos. Teto legal ao gasto de campanha.
8. Eliminação dos tratados contra a dupla tributação. Repatriação dos capitais roubados por empresas fantasmas, e confiscação das propriedades das pessoas e empresas envolvidas na grande fraude de superfaturamento de importações.
9. Eliminação do decreto 1606 que amplia a exploração de carvão nos territórios indígenas de Perijá. Autodemarcação territorial e respeito ao autogoverno dos povos originários.
10. Pelo não pagamento da dívida externa.
* Partido Socialismo e Liberdade é uma organização trotskista integrante da Unidade Internacional dos Trabalhadores - Quarta Internacional (UIT-QI), agrupamento internacional do qual faz parte a CST do Brasil.
** Puntofujismo é uma expressão que se refere ao período abarcado pelo pacto de Punto Fijo, que foi um acordo entre os principais partidos burgueses venezuelanos em busca de uma governabilidade em tempos de crise. Veja mais aqui: http://es.wikipedia.org/wiki/Pacto_de_Punto_Fijo